foto de uma menina de 7 anos na birmânia, ela está vestida para seu casamento.

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quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Proposta Catequética - É esse o vírus que eu sugiro que você contraia.

(na foto: Sem mentiras, apenas amor)

Abrir o blog com este texto já me parece bem interessante para mostrar quais debates devo introduzir aqui.

Uma noite antes da missa meu pároco me para e conversando ele me confessa a necessidade de entender a cara do jovem de nossa comunidade, este documento surgiu das reflexões que realizei sobre aquele questionamento, pois não sabia ele o como deveria agir melhor com a nossa juventude.

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Padre, da última vez que nos falamos o senhor me disse que não sabe qual é a cara do jovem de nossa paróquia. Na correria daquela conversa antes da missa eu coloquei algumas visões que tenho sobre juventude da qual faço parte e ficou a promessa de fazer algo por escrito.

Eu refleti antes sobre como deveria colocar nestes papéis as minhas contribuições, Pensei em colocar na forma de tópicos fechados, como propostas diretas de ação, o que seria bem prático de ler.

Mas quando me coloco em seu lugar de vigário, penso que o máximo de informações sobre as singularidades deste grupo tornará nosso trabalho muito mais fácil. Dessa maneira eu procuro unir a primeira idéia, topical, com um conteúdo de análise e descrição da realidade do jovem de nossa paróquia – a qual descrevo e analiso como jovem que comunga dela e como estudante crítico.

Meu caro padre, quase todos os jovens que vem a igreja o fazem por causa de um elo familiar ou afetivo. Eles estão aqui porque são praticamente arrastados pela família num primeiro momento, depois se começam a vir sem relutância é porque encontraram algum atrativo – bons colegas, uma paquera interessante ou uma oportunidade de Happy Hour.

Infelizmente, padre, Jesus não é a origem do prazer ou da felicidade em vir à igreja. Tão pouco é praticamente inexistente a idéia de que a igreja é o lugar para onde vamos para aprender mais a viver o Amor de Deus de maneira prática, e não apenas teórica.

Os jovens que conheço adoram música, assistem filmes e vivem na internet. Mesmo com pouco dinheiro são consumistas, a beleza impera sobre nós e o desejo de afirmação sexual é crescente. São muito espertos e inteligentes, porém alienados pela cultura de morte e pecado.

Seus conceitos e valores são muitas vezes fechados e funcionais. O carinho e o afeto, além de raros, hoje se expressam pela busca de namoros arrebatadores. Ou seja, o carinho e o afeto são coisas sexuais, corporais, uma vivência bem rasa e infértil.

Estou falando, padre, de jovens que não compreendem os valores cristãos, que acreditam que o modo de vida laico os fará felizes. Outra coisa que piora a situação é o tipo de visão que eles têm de Deus e de religião. O que é facilitada por uma evangelização, ou catequese, pobre.

Talvez, se nos colocássemos no lugar de um jovem que vem pela primeira vez a igreja no dia do aniversário da avó, possa ajudar.

“Hoje é domingo e João teve que voltar mais cedo do shopping pra não perder a hora da missa, depois da mãe ligar inúmeras vezes pra ele vir pra casa. João estava com uma ‘gatinha’ muito legal e não gostou de apressar seu encontro por causa da missa.

Quando ele chega em casa a única pessoa que realmente tem o desejo de estar na presença de Deus é a sua avó. A mãe está apressada pra ficar bem arrumada, a irmã no computador e o pai esperando para levar todos para a igreja sem a menor paciência. Certamente, com a idéia de ir para a igreja João não encontra expressões que estimulem a uma maior aceitabilidade.

Finalmente eles vão. Quando a missa começa, nos primeiros 10 minutos é o espetáculo do exótico. Uma fila bem bonitinha entrando na igreja enquanto toca uma musiquinha animada. Dessa forma o nosso jovem vai ficar virando a cabeça de um lado para o outro observando tudo.

Quando o padre fala usa uma linguagem, um vocabulário que é estranho ao dele; e as leituras que também têm suas palavras difíceis. João dificilmente entende porque começaram a contar historinhas simples na missa. Difícil mesmo é manter a atenção numa coisa só. Não demora pra que ele encontre pessoas como ele ali: uma bela moça, ou um grupo de jovens que ficam conversando baixinho e parecem e se divertirem muito.

Na homilia o Padre começa a falar umas coisas legais, do tipo: “Deus é bom; vamos servi-lo!” ou “O pecado nos faz infeliz, nos faz morrer!” – Quando João ouve aquilo não entende como pode ser infeliz, ele se sente bem e enxerga onde se justifica. Ele não tá na igreja sempre, não serve a Deus e se julga feliz.

Além disso, dificilmente João ouvirá tudo que o Padre falou, talvez porque aquela gatinha viu que ele estava ali e pode ser que role uma paquera, mas de um modo geral o jovens são pouco acostumados a manterem atenção constante em algo mais professoral.

Bom, depois de um senta, levanta, ajoelha e repete junto um bocado de frases; vem a hora de comer a bolachinha sem-sal. Que pra ele não é nada demais, nem sabe por que tanta gente quis ir comer aquilo, talvez porque seja obrigatório.

Finalmente a missa acaba e João volta pra casa pensando na gatinha que paquerou com ele. Na volta pra casa a mãe e a avó concordam que os irmãos deveriam ir mais à igreja, especialmente porque elas esperam que seja mais fácil educá-los ou que teriam mais tempo livre. João pensa que nem seria tão ruim assim voltar lá, quem sabe ele não consegue se aproximar da moça ou do jovens que chamaram sua atenção.”

Ø Uma pergunta que me faço é: “Em quantas das coisas que o jovem presencia na igreja ele realmente se identifica com?”; ou: “Quantas delas realmente compreende o motivo de serem vividas assim?”

Muitos adoram usar o jargão: “Jovem só quer diversão” – concordo – mas os adultos também são assim, a diferença é que estes agora já assumiram responsabilidades, trabalhos, para bancar seus prazeres e modos de vida. A maioria dos adultos reclama dos jovens que um dia foram. A nossa sociedade é a da busca constante pela felicidade – o que não necessariamente é ruim. - O problema está em como fazemos isso.

Ø Entender a realidade na qual somos jogados é uma tarefa dificílima que angustia especialmente ao jovem que precisa cada vez mais rápido saber o que quer da vida. Ainda que não saiba o que a vida significa.

Os prazeres e os lazeres se colocam para nós como escape dessas obrigações árduas de auto-conhecimento, que juntamente aparecem com uma concepção já fechada do jovem e um projeto de vida já todo melindrado para ele – eles não tem que fazer escolhas, ou quase nenhuma é só seguir o plano.

Está ai um sinal forte para compreender porque as últimas gerações tem sido hedonistas. Enquanto se pode viver o êxtase do prazer se pode esquecer a necessidade de compreender-se, ou a obrigação de viver algo que não se escolheu ou não se entende. O prazer é absoluto ao mostrar que é bom, é o produto perfeito, é oferecido sob a idéia de que o prazer é bom e ter muito prazer é ser feliz – o que pelo jeito tem dado muito certo.

Dilemas são problemas – os prazeres são as soluções. O problema é que de alguma forma sabemos e sentimos que essa busca continua falível, não sabemos como evitar a velhice ou o desgaste dos prazeres, então procura-se trocar de vetor ou aumentar as doses de prazer. E uma resposta realmente efetiva para essa bagunça não se tem.

Nossos jovens, padre, são hedonistas porque não entendem suas angústias. E seus prazeres são prazeres do esquecimento. E mesmo que não sejam perenes, funcionam por um tempo e é melhor um pouco do que nada.

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A Catequese

Alguns dos nossos jovens são provenientes de uma catequese anterior. Muitos deles fizeram a Primeira Eucarístia aqui e ficaram na Perseverança, mas parece que nada surtiu efeito. Padre, muitos de nossos jovens de hoje foram acompanhados na catequese do sábado e se hoje estão como João é porque houve alguma falha. - acredito que a catequese não supriu alguma necessidade essencial.

A catequese foi falha no sentido de ajudar os jovens a compreender a realidade deles bem como as verdades de Deus. Se em algum momento tentou foi com conceitos fechados em sua maioria, ou, historinhas semi-fantásticas. Acredito também que a falha esteja ainda no sentido de não ter ensinado a nossos jovens os prazeres de viver do Amor de Deus. – Essas tarefas são, de fato e dever, nossas tarefas principais com a juventude.

Queremos que nossos jovens sintam o prazer de servir a Cristo, em abster-se do pecado e em viver a simplicidade do Reino de Deus. Mas a forma como eles enxergam a realidade não lhes permite compreender esse convite como algo capaz de ser vivido, especialmente pela falta de testemunhos.

Catequizar qualquer público hoje, especialmente o jovem, requer a capacidade de saber mostrar a falência do modo de vida pagão e egoísta que tanto pagamos pra ver. E não adianta chegar dizendo: “que é ruim”; “que é pecado” ou “que Deus vai ficar triste” – é pouco, não diz muito pra aquele que se sente bem como está e não tem a vivência da fé para concordar.

As nossas existências, vidas, se prendem aos pecados porque acreditamos que nos fazem bem – como a fornicação ou a gula. Dessa forma, a nossa tarefa é inverter os valores que justificam as buscas de felicidade das pessoas.

Para isso é necessário ser muito competente, especialmente num saber crítico da nossa realidade, para mostrar que a sabedoria dos homens é falível e que a de Deus traz a verdadeira felicidade; exige-se assim forte competência teológica e catequética de todos os envolvidos.

1. Desde que foi organizada na nossa paróquia a catequese fica escanteada, maltratada, apesar do esforço heróico das catequistas que lutam para fazer algo.

Hoje escrevo para solucionar o problema da juventude que a catequese poderia ter-nos evitado. Os jovens santos que desejamos começam na catequese.

Padre, a catequese é o jardim onde plantamos os cristãos. Enquanto em nossa paróquia a catequese for um projeto de pequena importância teremos problemas piores que esses.

Nossos catequistas são todos leigos, o que não é necessariamente ruim, mas somos pouco formados em bíblia ou teologia, também pouco capazes de entender e criticar nossas próprias realidades a de nossos catequizandos e pouco se compreende o evangelho que se prega, especialmente em analogia com as realidades vividas, isto figura como outro grande desafio, o de ser capaz de mostrar que o evangelho está na realidade do mundo moderno do século atual, e não, obsoleto com mais de 2000 anos. – Padre, eu creio muito que o Espírito Santo age através de nós, mas bem sabemos que devemos fazer o melhor para o senhor Deus e instruir ao máximo os catequistas, em lugar de apenas esperar que o Espírito Santo sempre fale por eles, até mesmo Cristo ensinou aos seus seguidores para que pudessem ensinar bem depois.

Ø Precisamos urgentemente de capacitações bem atualizadas para nossos catequistas.

Ø A estrutura da catequese é precária desde o começo: salas, material, recursos humanos – é precária especialmente em prioridade – a catequese ocupa um lugar às escuras nos planos paroquiais

Ø Deve-se dar atenção especial à “Perseverança” que funciona como elo entre a 1ª

Comunhão e a Crisma, tem papel fundamental para evitar a dispersão dos jovens.

É na Perseverança que as crianças por volta dos 11 anos já não são tão inocentes e estão começando a conhecer a puberdade, momento em que o modelo de vida hedonista toma força neles. É nessa época também que já podemos introduzir uma catequese com maiores problematizações e reflexões a cerca da verdadeira vida cristã, vida de amor.

Eu acredito que a moral cristã deve agir como um vírus, que contamina o mal, convertendo-o para o amor em tudo. O mundo pagão e anticristão joga com a regra da morte, matar e vencer. Nós jogamos com a regra do Amor e da Vida, não queremos matá-los, queremos abraçá-los e nos unir em Amor. Jogar o mesmo jogo com regras diferentes é muito, muito difícil.

Neste momento da juventude o ideal pagão ainda está se solidificando, o que significa que há uma fraqueza por onde se pode agir, do contrário teremos reproduzido, mais uma vez, o problema da juventude que vivemos hoje. Por essa razão considero a Perseverança de altíssima importância.

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A questão que defendo aqui não é propriamente entupir de fisiologia nossa catequese. O problema é que a alienação do pecado é muito astuta e é preciso saber refletir de modo crítico sobre as práticas que temos no dia-a-dia, até mesmo nas práticas religiosas a ausência de reflexões bem direcionadas podem nos levar ao fanatismo ou outras práticas alienadas que, a bem da verdade, não nos aproximam de Deus. Considero-me mais a favor da crítica que da filosofia

Dessa maneira o pensamento humano, que é criação de Deus, pode nos ajudar a re-valorar as coisas que nos atingem. Ademais, também não proponho hiper-valorização do pensamento humano na conduta religiosa, mas sim o uso correto deste unido como uma sensibilidade mística direcionada ao Amor de Deus. Existe recorrente pensamento popular de que a Filosofia pode afastar de Deus, especialmente por causa dos últimos séculos em que a ciência gerou um ateísmo generalizado e laicizou boa parte do mundo ocidental. – O que figura como outro preconceito, que dessa forma também é alienante e por isso uma boa dose de crítica resolveria.

A crítica praticada como uma sensibilidade mística significa que ela está aliada ou direcionada para a Verdade de Cristo, para o Amor. Pensando compreendemos nossas ilusões e no mistério de Amor do Pai encontramos a busca fortuita para nossas vidas incompletas. - O bom combate.

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A afetividade constitui outro ponto delicadíssimo da nossa realidade e especialmente da juventude. Na verdade, é um problema que se aloja nas famílias como um todo.

Ao descrever “o perfil” do jovem de nossa paróquia não consigo evitar este tema da afetividade. E mais, ao tratar deste tema não consigo isolar o jovem de sua família e esta última do ritmo social que ela acompanha.

Se nós nos perguntamos sobre aquilo que para as crianças é uma expressão de amor, não demora para apontarmos os carinhos e cuidados dos pais e adultos.

Quanto mais novo se é, mais indefeso também se é. E dessa maneira todo cuidado e carinho tende a nos vir de forma muito gratuita. Mas, na medida em que crescemos devemos seguir regras que são incompreensíveis para a cabeça de uma criança, não conseguimos entender porque devemos segui-las, nem sabemos o que é bom ou mal dos adultos. – O bom é o carinho, o conforto, a proteção; o ruim é a ausência deles, a angústia, o choro é a expressão dessas angústias e faltas.

Junto com essas regras surgem as autoridades. Os pais que são “o porto seguro” nos impõem uma regra, e quando não a seguimos, a reação será de represália. Esta reação é um choque, é uma rejeição, mesmo que temporária vinda da pessoa que mais importa pra nós. Pela insegurança, pelo medo e pela impotência, a criança é submetida e acata a regra e depois de tanto tempo a naturaliza e só mais na frente, com certa maturidade poderá refletir se aquela regra foi boa ou não em ser acatada ou imposta, mas poucas pessoas refletem sobre as práticas que lhes foram impostas a fim de descobrir quais são oportunas ou não. Muitas passam a vida achando que tudo que seus pais ensinaram é verdadeiro e valioso.

- Não quero dizer que este processo seja necessariamente ruim, mas é a partir desta experiência que se estabelece uma nova relação de afeto entre pais e filhos.

A preocupação maior de uma criança é sentir-se amada, ou protegida, mas depois de certo momento para encontrar-se como tal ela precisa dar algo em troca para receber as provas de amor dos adultos. Ser amado ou sentir-se amado torna-se uma questão de merecimento. Aos poucos o amor já não parece mais uma coisa gratuita.

É aqui a zona de perigo da educação dos filhos. Esta relação se aproxima muito de uma relação de mercado, parece uma compra. Os filhos sofrem uma desilusão e como são dependentes dos pais esforçam-se para merecer seu amor e benefícios materiais que só eles podem prover. E os pais preocupados em fazer seus filhos felizes não medem esforços para fazê-los incorporar o modo de vida ideal, e dessa forma, a cada falha deles (filhos) criarão estratégias para evitar tais falhas, a rejeição pode ser uma delas.

São poucos os pais que tem a consciência de ressaltar e diferenciar que o amor deles é gratuito, ainda que lancem mão de medidas de “choque” em dado momento. Muitas vezes as reações de “choque” são justificadas pela idéia de que “a vida não é fácil, se você erra paga caro”. Eu não quero dizer que o Amor dos pais pelos filhos não sejam genuíno ou sincero, mas certamente quero dizer que com muita freqüência assume essa postura de troca condicional quase comercial.

Os laços gratuitos de amor existem e ali estão, mas as expressões deles quase sempre obedecem a essa dinâmica de troca. “Sei que meu pai me ama, mas pra sentir isso eu preciso merecer.” – Assim como um sapato precisa ser bom o suficiente pra merecer que eu dê 120 reais por ele, e mesmo que eu não dê, gosto de sapatos mesmo assim.

E ai vem a escola, na qual de maneiras diversas teremos que dar motivos e garantias para ser aceitos. Ser comportado, tirar boas notas, usar a farda limpinha, tratar bem as pessoas – pra sermos amados pela escola e pelas pessoas que nela estão, e mais, para continuarmos sendo amados pelos pais; porque se falhamos, logo chamam nossos pais e um inferno psicológico se faz contra nós.

Sempre achei esta cena terrível e assustadora. Hoje é ainda recorrente e quase sempre revela a falência educacional dos pais e da Escola para com as crianças, parecem que discutem a relação por não saberem como educar uma criança. É um atestado de falência, os adultos e a instituição envolvidos no episódio se frustram e quase sempre as retaliações recaem sobre a criança. - Eu sinto nojo, só de lembrar. - O resultado disso é quase sempre uma nova submissão da criança devido aos ataques psicológicos. Às vezes parecem um agiota, " se você não me pagar eu mato seus pais", se a criança não se comporta o ataque se dirige aos pais que e os efeitos reverberam aos filhos, que sendo o lado mais fraco, cedem.

Depois começamos a descobrir o interessante jogo do namoro, que também não se estabelece pela gratuidade, os medos das desilusões nos fazem buscar inúmeras garantias para nos prendermos a elas e buscarmos motivos para amar e sermos amados – temos que ser bonitos, educados, fieis, compreensivos, carinhosos e muitas outras coisas.

E aqui chegamos à outra ponta do ciclo vicioso, porque muitos desses namoros “de mercado”, de troca, se tornam casamentos e famílias com uma base de relação emocional de valor de troca, e nessas famílias, outras crianças serão educadas na mesma realidade de amar com garantias, amores comprados e vendidos.

Poderíamos contar nos dedos de uma só mão o número de jovens e famílias que escapam de algum modo à realidade que impera em nossa paróquia.

Ao procurarmos colocar a igreja e a religião nas histórias de vida dos jovens, se ignorarmos esta realidade ou se nada fazemos para desmitificá-la: nosso trabalho, nossa evangelização, não só será em vão, como ajudará a aprofundar as feridas e desilusões deles. – Imagine só, podemos estar, inconscientemente, ferindo aos irmãos e a nós mesmos em nome de Deus.

É com essa preocupação em mente que estabeleço minhas críticas sobre a realidade de nossa comunidade.

Acredito que uma equipe de catequese que já se preocupe com essa realidade está no caminho certo, mas não podem isolar o jovem na suas atividades, a família também deve estar na “mira” de nossos esforços. Depois de certo estágio de maturidade, e especialmente, pela ação da graça do Espírito, acredito que o jovem se torna um modificador da realidade doméstica. Mas é bem sensato atingir a família por um todo. Dessa maneira, o alargamento de um projeto catequético focado no jovem atinge também sua família, e assim chagamos à Pastoral da Família. – Que em nossa comunidade paroquial é muito mal organizada, nem mesmo se entende ou se coloca como grupo de catequese familiar, parece mais uma extensão ou remanescência do Encontro de Casais com Cristo.

Eu me arrisco a pensar que esse problema da afetividade de troca se estende por todos os grupos de nossa paróquia. Talvez seja por isso que temos tantas divisões e isolamentos de pastorais e pequenos grupos.

O Amor de Deus é absolutamente gratuito, Jesus se doa a todo o momento sem exigência de garantias. Mas poucas pessoas estão dispostas a fazer isso, talvez menos ainda tenham consciência da verdade que existe nesta atitude.

Muitas vezes se faz o trabalho buscando autopromoção e reconhecimento frente ao padre, favoritismo através de puxa-saquismos; quando, na verdade, poucos pensam como João Batista: “Que eu diminua e que Ele cresça”; ou como Paulo que se deixou morrer para que o Cristo vivesse nele. Falta a consciência da humildade, do desapego, a coragem para curvar-se ou para dar as mãos.

Não é por acaso que penso que a nossa tarefa é a mesma de Cristo, Ele veio ao nosso mundo para reorganizar os valores, para mostrar às pessoas um novo jeito de olhar o mundo e ser feliz de outra forma, uma forma autêntica. Penso que a Paróquia de Nossa Senhora do Bom Parto está no caminho certo, mas ainda é preciso completar algumas lacunas. Nossa paróquia realiza um esforço que é muitas vezes repetido por muitas outras comunidades religiosas, especialmente católicas e protestantes.

Tentamos mostrar ao jovem que a igreja não é um local de monotonia, ou “morgado”. Isso é bom, um ótimo exemplo desse esforço é o EJC, que possui um belo arrojo quando se pensa em encontro de jovens. Usam-se dinâmicas, peças, músicas alegres e assertivas. É muito eficaz, eles pulam, riem, dançam, se comovem e até choram – é uma grande festa.

É no EJC que seduzimos o jovem, ele volta para o pós-encontro porque ainda está sob o “maravilhamento” daquele trabalho fora do comum. Acredito que a verdadeira eficácia do EJC reside na gratuidade do carinho, do amor, nós fazemos tudo aquilo para estranhos, sem esperar compensações (ao menos em tese) e isso faz com eles chorem, especialmente porque aquela gratuidade lhes é muito rara. – Eles se sentem amados e por isso retornam.

Mas ai surge a pergunta: “Se EJC é tão bom, então porque os jovens somem da igreja com poucas semanas?”

Bom, eu acredito que a tentativa de mostrar que a igreja é ambiente de diversão e prazer para os jovens é boa. Mas ela por si só se esgota. Quando ficamos ao máximo tentando prolongar e repetir os momentos de festividade e agito a fim de apelar para o interesse do jovem, acreditando ser a diversão o principal e único objetivo deles – quando fazemos isso, acredito estarmos falhando ridiculamente, especialmente por falta de experiência religiosa. E mais, estamos nós teimosamente criando para nós mesmo uma idéia e identidade de jovens que não é a verdadeira.

Ø É muito engraçado ouvir um adulto ou idoso falando de jovens como se soubesse tudo sobre eles, especialmente porque já foi jovem um dia. É risível e vergonhoso. Cada geração possui uma singularidade, e criar para si uma imagem de juventude que não corresponde ao que de fato eles são é o que mais piora a eficácia de nosso trabalho.

Eu me pergunto por que deveríamos dar uma “cara” ao jovem da Paróquia do Bom Parto, para mim seria uma enorme e absurda generalização. Que estaria fadada aos riscos de: ficar ultrapassada temporalmente, não respeitar as singularidades nem as mudanças contínuas da vida humana. É fazer do jovem o que queremos que eles sejam dentro de nossas mentes, alocar neles uma identidade criada em nossos pré-conceitos que não lhes pertence e impor isso de fora para dentro, para depois exorcizá-las pela idéia de convertê-los para Cristo – Uma coisa bizarra, mas que sem dúvida desde o primeiro passo fada à falência o nosso esforço de levar o Amor às pessoas

Se queremos saber quem são os jovens então devemos viver com eles e amá-los. Jesus quis ser conhecido e amou, quando foi amado foi conhecido pelos seus companheiros, a quem Ele e chamou de amigos.

Não há uma cara, nem um rótulo para estes ou aqueles jovens, são apenas corações sonhadores que precisam do Amor de Deus. Ícaros que rezam para suas assas de cera não derreterem no primeiro grande vôo de suas vidas.

Como falei, a busca pelo prazer é quase sempre a luta para esquecer a angústia, o vazio. A diversão que o jovem encontra na igreja, a princípio, tem a mesma função, e quando nós deixamos que a idéia de estar na igreja se resuma a isso, cria-se ai um problema.

A igreja vai se tornar mais um “cano de escape” das angústias dos problemas, não muito diferente de um Prozac. E mais, depois de um tempo toda essa festividade perde a graça, o efeito enfraquece. Porque o prazer é apenas o intervalo entre um momento de sofrer e outro, aos poucos fica evidente que aquele paliativo não é verdadeiramente efetivo, e logo perde a graça, parte-se então para outra e a Igreja é abandonada, cai em desuso.

O jovem não precisa só de diversão, ele precisa saber como vencer suas mazelas, como lutar contra suas angústias. Na minha visão a diversão funciona como um atrativo, ou até como uma forma de quebrar um preconceito, e nisso me parece fortuito. Ela permite que se esqueça a dor e se manifesta como a presença do lúdico que esta fortemente ligada ao espírito infantil, é bom ser criança, as crianças brincam.

Mas é Jesus quem cura as feridas e as angústias. Precisamos ajudar os jovens a entenderem isso, que a alegria não vem somente da diversão, ela vem em maior grau da graça que se alcança em entregar o coração a Amor de Deus. Ou seja, ajudar o jovem a criar ou adquirir novos valores.

Enquanto se busca a diversão e o prazer do esquecimento é porque Deus não é senhor dos nossos corações e a razão da nossa felicidade está antes em nós mesmos e nos projetos de felicidade focados somente nos esforços humanos sem amor. A igreja deve apresentar-se como um projeto de felicidade que concilia, reconecta, os homens e Deus. E se a igreja e os catequistas perpetuam aquela busca pela diversão sem, ao contrário, desmistificar a realidade dos desejos; estamos na verdade, fazendo muito pouco.

Preocupamo-nos em dar a diversão ao jovem dentro da igreja pra que ele se sinta feliz nela, mas não nos preocupamos de ajudá-los a entender o mundo e as mazelas que os acompanham dentro e fora da igreja. Eles já buscam o prazer vazio fora da igreja e se continuarem fazendo o mesmo aqui dentro, não terá mudado quase nada e nosso trabalho será infrutífero. Quando voltarem para a rotina fora da Igreja lá estarão suas mazelas e "demônios" e nada poderão fazer, senão fugir como quase sempre se faz.

Ø A maioria dos trabalhos dirigidos aos jovens e especialmente o EJC tem um foco forte na diversão, mas muito pouco se faz para ajudá-los a ter nova consciência sobre a vida deles e da vida na igreja. Muitas vezes também o EJC se apresenta como um grupo isolado do Grupo Jovem de catequese da paróquia.

E algum tempo depois do EJC, muitas vezes tentamos mostrar que existem regras, uma lei e obrigações para aquele que vive na igreja, especialmente para o jovem, que “não quer nada com a vida.” E de repente tudo que parecia gratuito já parece pedir algo em trocar para que se mereça mais – e caímos no caído vicioso que se experimenta na realidade pagã.

O amor de Deus é gratuito, amar tem por condição necessária uma escolha, um ato de liberdade, como podemos exigir algo? – Deus nos põe livres, nosso trabalho é jogar a semente, abrir os olhos dos outros, ou melhor, permitir que Deus abra-lhes os olhos. Não se pode exigir de alguém o que ele não tem para dar.


Não se pode exigir de alguém o que ele não tem para dar. É preciso um trabalho de catequese que para os jovens transpareça a todo tempo a gratuidade do Amor de Deus, que permita compreender a busca inútil da felicidade em si mesmo e que ensine como entregar-se dia após dia ao coração de Deus é encontrar uma alegria que não se esgote ou se resuma em si mesma. Com este sentimento e atitude transmitidos as pessoas passam ativamente a praticar a gratuidade do Amor.


É nesse sentido que proponho uma catequese do afeto gratuito. O catequista precisa figurar como aquele que se sente feliz por dar-se a Deus uma vez que percebe que tudo lhe foi dado pela generosidade do Pai. E da mesma forma repassa todo o carinho aos outros, não na esperança de conseguir a fidelidade em troca. Quando dou meu carinho é porque ele existe em mim a partir de um amor e vivê-lo já me faz feliz, não é necessário mais nada, o carinho surge como expressão inevitável da abundância e da generosidade do Amor vivido por mim no Pai.


O objetivo de quem dá carinho é sentir-se bem fazendo outra pessoa sentir-se bem, qualquer outra reação além disso é um outro fruto. Se um ato de amor já alcançou seu objetivo, já é feliz em si.


Não temos que ficar exigindo retornos, mas mostrar a beleza e importância de servir e ser humilde, a urgência em sarar feridas e matar a fome. É preciso dar testemunho da felicidade que se vive ao ser generoso no Amor de Deus – isso exige especialmente verdadeira vivência daqueles que catequizam. Afinal “a boca fala aquilo do que o coração está cheio.” – E nesse sentido pergunto: estão nossos catequistas mergulhados no Amor de Deus para que o Espírito os inspire e aja através deles?; é preciso cada vez mais mergulhar no mistério da Eucaristia.


Eu acredito verdadeiramente no sentimento de responsabilidade que surge por uma necessidade inevitável de continuar a viver o Amor e de servir como materialização deste Amor. Quando o jovem toma consciência da importância que o Amor tem para ele e que essa felicidade também é essencial para tantos outros que sofrem, ele se sentirá responsável por fazer-se instrumento do Amor de Deus na vida dos que sofrem. Aqui a gratuidade segue conservada.


E muito mais, através do Divino, permite-se a si mesmo encontrar a semelhança com os outros, especialmente por não fugir da dor, ou do sofrimento. Encará-lo, entendê-lo, em Deus vencê-lo e dessa forma perceber que tantos outros ao nosso redor são como nós. As barreiras da individualidade humana se dissolvem em relação a Deus e aos outros humanos. Curiosamente a dor e o Amor nos permitem entender como somos iguais e como necessitamos um dos outros e como é importante para nós o cuidado mútuo. – bem como nos propõe Paulo, “Sede servos um dos outros”. A dor é semelhante e comum nos humanos, e o Amor é a cura comum que vem de Deus para seus filhos e filhas, são assim os dois vetores de aproximação e comunhão da humanidade nela mesma e no Cristo Vivo, Deus Amor. Aqui se mostra o caminho da Paz, por isso inverto a frase, "Paz e Amor" para "Amor e Paz".


É preciso urgentemente inspirar nossa comunidade à gratuitamente ser como São Francisco desejou ardentemente ser. Levar a Paz e a presença do Pai a todo e tudo e assim sentir que o Pai também está conosco. Se queremos ter Amor é importante antes levar Amor: muitas vezes o que mais queremos em nós só surge pelo desejo ardente de levá-lo a alguém com muita sinceridade e desapego, aquela riqueza ausente surge em medida abundante para todos, para si também, acredito que ai se revela a magia do Amor em gerar pela sinceridade da doação. Nada nos pertence, mas quando há em nós o rico desejo de acolher e ajudar, teremos tudo que for necessário na medida certa como fruto verdadeiro do Amor. É isso que eu definiria por abraçar a cruz, ou combater o bom combate.


É urgente abraçar a cruz e combater o bom combate.

Por Túlio Miranda. ( Se gostou, INDIQUE =D )

6 comentários:

  1. Túlio, Deus seja louvado em sua vida.
    Gostei mesmo de sua iniciativa!
    Espero que vc continue sempre um excelente evangelizador, servindo-se de todos os meios possíveis para o bem salvífico de todos.
    Continue assim, no vigor do Espírito Santo.
    Um forte abraço
    e um carinho feliz natal
    e feliz novo ano.

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  2. PARABÉNS,realmente é preciso que alguém incentive os jovens e adultos a se dedicar mas a obra,de uma certa forma voçe está contribuindo com as suas palavras nesse lindo texto ,continue assim,que Deus te abençoe,feliz ano novo!!!!!

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  3. Muito boa sua reflexão,é sempre bom pensar nos problemas que nos cercam e que fingimos não enxergar.Mas, meu caro essas contradições sempre fizeram e sempre farão parte do mundo e do nosso sistema,infelizmente.Até o momento, único e que já mostrou ser capaz de se apresentar de várias formas,como um coringa em um jogo de cartas.A respeito das mandingas,elas fazem parte da tradições e cultura de um povo, é extremamente forte e viva, afinal de contas o homem sempre buscou respostas que explicassem os fatos curiosos da vida, temos essa necessidade.Acredito que , somos capazes de diminuir as injustiças do mundo,mas nunca acabá-las.Por outro lado, não podemos deixar de fazer o que acreditamos que seja verdade, porque os cético não acreditam!!!!temos que nos anestesiar em alguns momentos, fechar pra balanço mesmo,para não enlouqueçermos!!!!o mundo não mudará da noite pro dia!!!sou muito idealista, acredito em um país mais digno e justo;não o ideal,porque ele não existe!!!!quanto aos fatos que envolvem a cristandade não acredito que seja pertinente adentrar nesse mérito, do mais temos que viver de bem com a vida, e fazer tudo aquilo que acreditamos que seja certo!!!fazer nossa parte enquanto cidadão do mundo, mudar realidades visíveis aos nossos olhos e palpáveis a nossas mãos,plantando valores,impulsionar a esperança, mostrar que é possível sim!!mas que ,também teremos que assumir responsabilidades,para que alcacemos uma sociedade mais condizente com nossos ideais.

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  4. Para Deco ...
    Obrigado pelas críticas =D
    Contradições e Tradições, temos em todas as culturas, minha intenção não é acabar com todas. Acho que as contradições se colocam como elementos básicos da vida e a tradição é essencial para a solidificação da cultura. O que me desejo mostrar é a necessidade de não mostrar nenhuma passividade ou empatia com as perversidades existentes em qualquer situação da vida. Tanto meu ofício e o seu estão ligados as tradições e contradições culturais e, particularmente, acho que são encantadoras por mostrarem as profundidades da experiência humana. Quanto ao ceticismo e realismo da atitude justa e coerente; concordo com tua atitude de ter o pé no chão e saber que mudaremos o mundo aos poucos, mas eu perguntou, ?Se pensarmos que nossa luta não terá resultados servirá? - Eu me coloco mais para a noção da mudança interior que gradualmente atinge o exterior como uma condição inevitável da paz. Vejo que você tem fé na justiça e na atitude correta das pessoas, isso é muito bom. Eu gosto de acreditar que sempre poderemos mais, se haverá um mundo perfeito, precisamos começar a mudar pra saber se ele é possivel... ?Como podemos antecipar o futuro? - Sei que se hoje eu fizer algo por amor, melhor será nosso momento. Gosto da rasoabilidade que os céticos praticam, mas por tais sensos não podemos antecipar o futuro e dizer como ele será ou não, ou se nossa sociedade será verdadeiramente justa ou não, acho que é uma questão de Fé. Você pode dizer que sou como Lennon, um sonhador. "Mas eu não sou o único", acho que ser teimoso tem suas vantagens =D

    Obrigado mesmo meu amigo da Leis pelo seu carinho em abrir este debate comigo !!

    abraços e que O Amor de Deus ilumine sua vida !

    Túlio Miranda

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  5. Obrigado a Rafhaela e a Discipulado pelas palavras de apoio. Peço que estejam comigo para que possamos doar o que eu não posso doar sozinho a quem precisar !

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  6. meu caro amigo, suas reflexões e textos são muito construtivos e vem mostrar a realidade das nossas vidas em comunidades e sociedades de que muitas vezes nos tornamos o produto ambicioso e frio, deixando o amor de Deus de lado e percorrendo um caminho no meio de um ´´vazio`` que só Deus pode preencher. Somos resultado da sua vontade e devemos ao menos tentar seguir seus preceitos para que nos tornemos pessoas e cristãos melhores.

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